Nossa, faz tempo que não postamos nada por aqui. Peço desculpas a quem estava acompanhando, mas nesse processo todo andei desanimando bastante, confesso, em tocar pra frente o projeto da kombi. Muitos mecânicos trapaceiros, muito dinheiro gasto a mais desnecessariamente e muitos problemas persistentes em aparecer mesmo depois de tanto tentar arrumar...
Depois que viajamos pra Matinhos no começo do ano e tivemos um problema com gasolina adulterada e um barulho de batida intermitente de não sabíamos o quê na parte de trás, e de passarmos pelo medo de termos que ser guinchadas no meio da estrada a qualquer momento, resolvi dar um tempo de oficinas, pro meu bolso e disposição se recuperarem.
Ela ficou uns dois meses na garagem, até que meu pai teve a iniciativa de mexer nela. Trocamos a bateria, ele regulou o ponto. Eu também voltei a me empolgar e resolvi com uma gambiarra um problema elétrico de mau contato do cabo principal nos fusíveis, fiz troca de óleo e o vazamento excessivo até cessou por um tempo, e comecei um trabalho de funilaria caseira pra fechar os pontos de infiltração de água pelas janelas com massa plástica (numa outra oportunidade postarei sobre isso). E deu certo! Ela voltou a rodar, e rodamos bastante por aí com ela. Andamos tanto que resolvemos viajar novamente, dessa vez até Tibagi, pra conhecermos o Canyon Guartelá.
Uma semana antes de irmos, levamos a Virgínia num outro mecânico pra uma coisa básica, só pra ajustar a correia que estava patinando (o que faz com que o alternador vá se desgastando mais rápido). Ele foi bem legal com a gente e nem cobrou pelo serviço, mas é como dizem: quando a esmola é muita, o santo desconfia. O barulho de batida que ela fez na viagem anterior não havia aparecido mais e o desempenho km/L estava até melhor do que antes. Nosso pensamento foi: só vamos saber se ela está boa para viajar, viajando!
Queríamos aproveitar que seria o último dia de chuva de meteoros e Lua Cheia pra passarmos a noite acampando no Parque Estadual do Guartelá. Saímos no sábado depois do trabalho, dessa vez quem foi pilotando na estrada fui eu, pela primeira vez com a carteira de motorista recém tirada. A emoção era muito grande! Primeira pisada funda em pista larga, Sol se pondo na minha frente, a Dani do meu lado e o John John atrás com sua good vibe infinita.
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foto: Dani |
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foto: John John |
Tava tudo perfeito! Até que próximos de Ponta Grossa comecei a ouvir um barulho estranho, que não era de nada que estivesse dentro da kombi. Parei no acostamento, o sol ainda dava suas últimas pinceladas no céu. Pra nossa surpresa quando abri a tampa do motor a correia estava desfiando, o barulho era dos fios soltos batendo, e não sei como a parte dentada dela virou ao contrário. Cortamos os fios pra que ela não desfiasse mais e seguimos em pensamento positivo até o posto mais próximo.
Paramos no primeiro, só havia um borracheiro com má vontade que sem nem ao menos ver o caso, disse que já era para o motor ter fundido e que ele só mexia com pneus. Quando ele falou ~fundir motor~ o desespero pra achar o próximo posto mudou totalmente o clima da viagem (isso porque o motor refrigerado a ar precisa do alternador em rotação pra resfriar, além de recarregar a bateria). Lembram do barulho de batida intermitente? Pois é, a essa altura, pra piorar nosso estado de nervos ele resolveu aparecer também. Paramos mais uma vez num acostamento. Ligamos pra CCR RodoNorte pra pedir suporte e eles passaram o número de um mecânico. Já era noite e àquela hora, num sábado, mesmo há poucos quilômetros da cidade, o preço pelo "resgate" seria de R$120 só pra arrumar a correia (que custa em média R$15, e eu sabia disso).
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foto:John John |
Não dei o braço a torcer ao primeiro explorador de pessoas desesperadas! Mentalizei com mais força pra que a Virgínia aguentasse as pontas até conseguirmos ajuda. Paramos no segundo posto que encontramos. Mais um borracheiro negou ajuda, mas resolvemos olhar na loja do posto se eles não vendiam correias. Eu tinha certeza de que não, mas aquilo foi a nossa salvação. O atendente foi muito prestativo, tentou colocar uma correia de bomba de sei lá o quê (que não servia), e vendo que não havia como trocar a correia ele se dispôs em pelo menos reposicionar ela com os dentes para dentro pra que aguentássemos mais um pouco de estrada até achar ajuda que valesse. Na primeira girada de motor ela inverteu novamente e nisso um bom rapaz se aproximou e disse convictamente que no próximo posto, há 2km dali eles vendiam correias com certeza. Partimos em disparada até lá e pra meu espanto eles não vendiam correia, mas na minha frente havia um mecânico cansado que já estava indo para casa. De poucas palavras, o mecânico Cristiano disse para nos apressarmos porque ele queria descansar logo. Seguimos ele até a sua oficina, já dentro de Ponta Grossa. Que galpão fantástico!
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foto: John John |
E o homem de poucas palavras em instantes trocou a correia, ajustou duas vezes. Falei do barulho de batida intermitente que vinha da parte de trás. Diagnóstico imediato e preciso: coifa da homocinética gasta na roda traseira, aguenta ainda mais um tempo, mas não devo ignorar o problema. Um alívio pra quem já havia sido desenganada com mancal, virabrequim e rebimboca da parafuseta. O preço pela mão de obra e pela correia? O total de R$35 (bem melhor que R$120).
Aceleramos fundo ao nosso destino que já estava perto, agora com os corações mais leves... coração leve e cabeça avoada. Depois de nos preocuparmos tanto com a maldita correia e focarmos só nisso em todos os postos de gasolina que paramos, esquecemos de nos atentar à gasolina. Já estávamos saindo de Castro quando percebemos que já estava entrando na reserva, mas como havia ainda mais uns 30km pela frente acreditamos que passaríamos ainda por pelo menos mais um posto. O problema é que entramos numa PR de mão dupla e pista única sem acostamento, que não tinha fim, nem posto, nem casas. Mais uma vez o desespero bateu forte e mais uma vez contando com muita sorte e pensamento positivo, a gasolina acabou exatamente na porteira do nosso destino final: o Recanto Ecológico da Dóra. Já era quase meia noite e resolvemos dar um tempo e esperar pela chuva de meteoros ali mesmo. Não vimos. O cansaço gerado pelos transtornos falou mais alto e descemos o restante da estradinha de chão a pé com nossas barracas e o suficiente para passarmos a noite. No dia seguinte nos preocuparíamos com o resto.
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foto: John John
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Quando eu acordei, meu pé esquerdo estava uma batata gigante, inchado e dolorido. Algum inseto me picou no meio da confusão e me deu alergia. Resolvemos com a dona do camping a questão da gasolina e ela traria mais tarde pra nós - quando fosse pra cidade - um galão de combustível. Finalmente relaxamos e aproveitamos a natureza e tudo o que fez valer a pena chegarmos até ali. Encontramos uma amiga da Dani e a namorada dela que chegaram de moto de manhãzinha e iniciamos a trilha pelo Parque. O banho de rio nos panelões foi revigorante e devolveu a energia que estávamos precisando e a água gelada trazia alívio pro meu pé febril.
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foto: John John (cachoeira no Recanto da Dóra, há poucos metros da nossa barraca)
onde a kombi estacionou sem gasolina
foto: Katy
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O dia foi lindo! Aproveitamos ao máximo. Mas depois dele vem a noite, e pra viajantes desajuizados isso pode ser perigoso.
Colocamos 5L do galão na kombi pra chegar até Tibagi e de lá poder encher o tanque pra voltar pra Curitiba, e logo de saída ela se comportou de modo estranho, mas não demos importância e seguimos em frente com o sol se pondo novamente.
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foto: John John |
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foto: John John |
Assim que a escuridão tomou conta, naquela estrada de mão dupla, pista única e sem acostamento, a kombi apagou os faróis e desligou o motor. O volante travou. Nada fazia com que ela ligasse. Nem mesmo o pisca alerta ligava. Jesus! Os carros atrás vinham em muita velocidade e a lanterna que eu queria usar pra ver os fusíveis tinha de ser usada pelo John John para alertar quem vinha chutado atrás. Dessa vez eu não sabia o que fazer. Finalmente a Dani conseguiu destravar o voltante e a gente pôde empurrar um pouco mais pra borda da pista, arriscando de quase cair em uma vala. Ninguém parava pra ajudar. Eu já estava quase certa de que por causa da correia o alternador tivesse ido pro pau e que nunca sairíamos dali. Até que um carro com um senhor e sua família pararam pra prestar ajuda. Deixamos a kombi lá mesmo porque num domingo a noite ninguém ia conseguir resolver nada, e eles nos levaram até um hotel barato em Tibagi, foram muito queridos! Sugeri ao John John que ele pegasse um ônibus pra poder trabalhar no dia seguinte, mas ele em sua enorme parceria, ficou com a gente até o final. O que me fez dormir aquela noite foi um remédio anti-alérgico que a Dani comprou que me deu muito sono, mas a cabeça estava a milhão. Lembrei da gambiarra com o cabo principal dos fusíveis. Não ia pagar pra alguém ir lá ver e ainda arriscar de dizer que era outra coisa, que era o alternador por exemplo, sem que realmente fosse.
Na manhã seguinte, cedinho, era segunda-feira e seria certeiro achar uma auto-elétrica. Comprei 10 fusíveis por R$5 e lá conhecemos o Ronaldo que estava arrumando seu alternador e se ofereceu em nos levar até onde a Virgínia tinha sido deixada. - É muito louco como nessa vida tudo é um ciclo. O Ronaldo poucos dias antes tinha ficado na estrada também e precisou da ajuda de alguém pra sair daquela situação. Nesse dia ele teve a chance de retribuir. - Troquei uns 4 fusíveis que estavam meio avariados e percebi que quando mexia no fio principal ele dava mau contato. Dei um jeito momentâneo e conseguimos levá-la até a auto-elétrica pra soldar, por apenas R$5. Enchemos o tanque e pé na tábua!
Agora na volta, quem veio dirigindo foi o John John, todo faceiro. Tudo ocorreu bem finalmente. Conseguimos chegar em Curitiba, felizmente sem muitos prejuízos, porém com muito aprendizado com a humanidade e a compaixão das pessoas que sem nos conhecer nos ajudaram de boa fé, e muita gratidão por essa força maior que nos impulsionou a chegar aos trancos e barrancos no melhor lugar que as circunstâncias nos permitiu, até o limite. Ao mesmo tempo que muita energia foi gasta por coisas tão simples, ainda assim fico feliz de que cada vez mais eu entendo um pouquinho melhor do funcionamento da Virgínia e que de alguma forma consigo resolver as coisas sem ser mais enganada, graças a muitos vídeos no youtube, fóruns de discussão, e o mais importante, a ajuda de kombeiros que sempre nos socorreram em perrengues na cidade. Parece que ter uma kombi gera uma conexão maior com cada pedacinho da estrada. Uma paisagem não é só uma paisagem, pode ser um lugar de parada, mesmo que forçada. As pessoas não são só transeuntes, elas podem ter trocas entre si. E as pessoas que estão ao seu lado, se tornam pilares e demonstram que parceria não é só curtição. Isso tudo gera união e eu sou grata por isso.
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felicidade só é real quando compartilhada. |
Para terminar, o saldo da nossa pequena viagem foi:
- R$110 de gasolina para ir
- R$35 da correia no meio da estrada
- R$30 do camping Recanto da Dóra
- R$20 de gasolina emergencial - R$15 do galão
- R$35 do Hotel Tibagi II (com café da manhã)
- R$10 fusíveis e solda
- R$130 gasolina pra retornar
- R$57 pedágios ida/volta
Quer saber o que a gente escutou na estrada pra aliviar toda essa tensão?
Tem uma playlist da Virgínia no
Spotify pra você viajar, da maneira que quiser.
ATÉ MAIS. :)